sábado, 25 de abril de 2020

Paralelo entre as obras de Oswaldo Guayasamín e o Direito Internacional Humanitário

Oswaldo Guayasamín, foi um pintor equatoriano que viveu entre 1919 e 1999. Ele sempre retratava em suas obras temas sociais, que refletiam a dor e a miséria, a violência contra o ser humano, as torturas, a fome, a desigualdade, a não tolerância.  Suas obras representam a luta, a esperança e a reivindicação dos mais humildes, vítimas de humilhação e abuso por parte dos organismos do poder.    
Ele foi um expoente da luta contra o colonialismo, denunciava a violência cometida contra o homem ao longo do conturbado século 20, marcado por guerras, campos de concentração e de extermínio, ditaduras discricionárias e sangrentas e usava o seu talento para influenciar a busca de um mundo mais justo e menos agressivo.  Apesar de toda revolta exposta em suas telas, ele não militou em nenhum partido político, mas definia-se como marxista-fidelista, mesmo retratando a dor e horrores causados principalmente nas guerras entre regimes fascistas e comunistas. 

Cabeça de Napalm 
 
A obra é marcada por inesquecíveis rostos e mãos do povo indígena, de forma extremamente expressivas, cada linha é torta e descontínua, toda superfície está manchada e suja, retrata tanta dor, que se aproxima da loucura. 
O trabalho foi pintado em 1976, um tempo de guerras e revoluções em vários países da região. É uma pintura quase monocromática, representando o rosto horrorizado de um personagem com olhos vazios e metade do rosto vermelho, enquanto é queimado por napalm. 
(Napalm (mistura de Naftenato de alumínio e Palmitato de alumínio mono e di-hidroxilados), NP (NaPalm) é associado a um conjunto de líquidos inflamáveis à base de gasolina gelificada, utilizados como armamento militar incendiário convencional.) 

Há quem diga que esse personagem não é representado enquanto queima, mas está assistindo com medo o fogo causado pela bomba de napalm, talvez sua aldeia, sua família ou talvez também sua raça. Sua mão tenta esconder o rosto desconexo, mas não pode impedir que a ação continue e se desenvolva, a identificação com esse personagem é verificada através da contemplação do horror. 
Nota-se um paralelo com a População Trang Bang, no meio da Guerra do Vietnã e o que sofreram quando o regime comunista do Norte tomou conta do sul do Vietnã, em que eram atacados e bombardeados com Napalm, fato que gerou a fotografia mais famosa da Guerra do Vietnã há 40 anos e ganhadora do Pulitzer. 

Os mutilados 
Inserindo imagem... 

Em 1947 quando estava num campo de futebol na Espanha ele se deparou com um lugar de destaque no campo pra que, em todos os jogos, ali acomodassem gratuitamente os mutilados da Guerra Civil. Ele consciente da condição humana, engoliu as imagens e foi tão difícil a assimilação do que via, quanto criar os quadros que resultaram dessa vivência. Em seus arquivos há milhares e milhares de desenhos, tentativas que só o satisfizeram na versão que terminou em 1977. 

Nele, Guayasamín trabalhou durante 8 anos, a partir de 460 rascunhos prévios. O mural é composto por 6 painéis quadrados que podem ser colocados em seis diferentes lugares cada um e girados em 4 posições distintas, de modo que existem, formas diferentes de vê-lo. 
Este mural é uma homenagem e dedicado às vítimas da guerra civil espanhola, com uma ideologia sócio-política e humanística. 

Direito Humanitário 

O Direito Internacional Humanitário é um conjunto de normas que, procura limitar os efeitos de conflitos armados. Protege as pessoas que não participam ou que deixaram de participar nas hostilidades, e restringe os meios e métodos de combate. O Direito Internacional Humanitário (DIH) é também designado por Direito da Guerra e por Direito dos Conflitos Armados.
O desenvolvimento moderno do Direito teve início na década de 1860; desde essa altura, os Estados acordaram numa série de normas práticas, baseadas na dura experiência da guerra moderna, que refletem num delicado equilíbrio entre as preocupações humanitárias e as necessidades militares dos Estados. Com o crescimento da comunidade internacional, aumentou igualmente o número de Estados em todo o mundo que contribuíram para o desenvolvimento do Direito Internacional Humanitário, que pode hoje em dia ser considerado como um sistema de Direito verdadeiramente universal. 

Uma parte considerável do Direito Internacional Humanitário encontra-se nas quatros Convenções de Genebra de 1949. Quase todos os países do mundo aceitaram a vinculação às Convenções, que foram desenvolvidas e completadas por mais dois acordos – os Protocolos Adicionais de 1977. 
Existem ainda vários acordos que proíbem o uso de certas armas e táticas militares, entre as quais as Convenções de Haia de 1907, a Convenção das Armas Bacteriológicas (Biológicas) de 1972, a Convenção das Armas Convencionais de 1980 e a Convenção das Armas Químicas de 1993. A Convenção de Haia de 1954 protege o patrimônio cultural em tempo de conflito armado. 

As Convenções de Genebra e seus Protocolos Adicionais compõe o núcleo do Direito Internacional Humanitário, o ramo do Direito Internacional que regula a condução dos conflitos armados, buscando limitar seus efeitos. Protegem especificamente as pessoas que não participam das hostilidades (civis, profissionais da saúde e humanitários) e as que deixaram de participar, como os soldados feridos, enfermos e náufragos e os prisioneiros de guerra. 

As Convenções e seus Protocolos estipulam medidas a serem tomadas para evitar ou colocar um fim em todas as violações. Contêm normas estritas para lidar com as chamadas “infrações graves”. Os indivíduos responsáveis pelas infrações graves devem ser encontrados, julgados ou extraditados, seja qual for sua nacionalidade. 
Hoje em dia, muitas das normas do Direito Internacional Humanitário são aceitas como Direito Consuetudinário, ou seja, como regras gerais que se aplicam a todos os Estados. 

Ele abrange duas áreas, que protege e restringe, ou seja, ele protege as pessoas que não participam no combate, tais como aqueles que foram feridos ou que naufragaram, que estão doentes ou que foram feitos prisioneiros de guerra. 
As pessoas protegidas não devem ser atacadas; não se lhes deve infligir maus-tratos físicos ou tratamento degradantes; os feridos e doentes devem ser recolhidos e tratados. Existem normas específicas que se aplicam aos indivíduos que foram feitos prisioneiros ou que foram detidos; tais normas incluem a provisão de alimentação adequada, abrigo idôneo, assim como garantias jurídicas. 

Certos locais e objetos, tais como hospitais e ambulâncias estão igualmente protegidos e não devem ser atacados. O Direito Internacional Humanitário estabelece uma série de emblemas e sinais, facilmente reconhecíveis, entre os quais a cruz vermelha e o crescente vermelho. Eles podem ser utilizados para identificar pessoas e locais protegidos. 

E a segunda área de restrição, que consiste nas restrições sobre armas a táticas militares, proibindo todos os meios e métodos de combate que, não discriminem entre as pessoas que participam nas hostilidades e as pessoas que, tal como os civis, não participam nelas, causem ferimentos supérfluos ou sofrimentos desnecessários; causem danos graves ou duradouros ao meio ambiente. 

O Direito Internacional Humanitário proibiu assim o uso de muitas armas, entre as quais as balas explosivas, armas químicas e biológicas, assim como armas a laser que provocam cegueira. 
O Direito Internacional Humanitário é aplicado apenas a conflitos armados, assim, não abrange os distúrbios internos tais como atos isolados de violência, nem regulamenta se um estado pode ou não utilizar a força. Este aspecto é regido por uma parte importante, mas distinta, do Direito Internacional, que consta na Carta das Nações Unidas. O Direito Internacional só é aplicável após o início de um conflito e aplica-se uniformemente a todas as partes, independentemente de quem começou as hostilidades. 

O Direito Internacional Humanitário distingue entre conflitos armados internacionais e conflitos armados internos. Os conflitos armados internacionais são aqueles em que estão envolvidos pelo menos dois Estados; são objeto de um vasto conjunto de normas que incluem as que constam nas quatro Convenções de Genebra e no primeiro Protocolo Adicional. No entanto, da mesma forma que nos conflitos armados internacionais, num conflito armado interno todas as partes devem agir em conformidade com o Direito Internacional Humanitário. 

É importante distinguir entre Direito Internacional Humanitário e o Direito Internacional dos Direitos Humanos. Embora algumas das suas normas sejam idênticas, estes dois corpos de Direito desenvolveram -se separadamente e constam em tratados diferentes. Em particular, contrariamente ao que acontece no Direito Internacional Humanitário, o Direito Internacional dos Direitos Humanos aplica-se em tempo de paz e muitas das suas disposições podem ser suspensas durante um conflito armado. 

Existem atualmente cerca de trinta textos internacionais em matéria de DIH. Entre eles podemos citar: as 15 Convenções da Haia de 1899 e de 1907 N.T.1 , o Protocolo de Genebra de 17 de Junho de 1925 N.T.2 , as 4 Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949, a Convenção e o Protocolo da Haia de 14 de Maio de 1954 N.T.3 , os 2 Protocolos Adicionais de 8 de Junho de 1977 N.T.4 , a Convenção das Nações Unidas de 10 de Abril de 1981 N.T.5 , o Tratado de Paris de 15 de Janeiro de 1993 N.T.6 e a Convenção de Ottawa de 3 de Dezembro de 1997 N.T.7. 

Voltando às origens da primeira Convenção, foi no ano 1864 que 16 Potências, por meio dos seus plenipotenciários convocados pelo Conselho Federal Suíço, a pedido do CICV, participaram numa Conferência Diplomática que aprovou a "Convenção para melhorar a sorte que correm os feridos nos exércitos em campanha". 

Sem dúvida, o texto desse acordo, com seus dez únicos artigos, parece muito sucinto, em nossos dias. Não obstante, nesta Convenção, que estipulava essencialmente o respeito e a proteção ao pessoal e às instalações sanitárias, se acordou o princípio essencial de que os militares feridos ou doentes seriam recolhidos e cuidados, qualquer que fosse a nação a que pertencessem, e se instituiu o signo distintivo da "cruz vermelha sobre fundo branco", cores invertidas da bandeira nacional suíça. 

Posteriormente, o DIH moderno, e mais particularmente o chamado "direito de Genebra" continuou se desenvolvendo a partir de experiências dramáticas, e sempre foi o aumento do sofrimento humano o que induziu à elaboração de novas normas para tentar limitá-lo. Essa comprovação fez com que sempre houvesse "atraso de uma Convenção", com respeito às guerras do momento. 

O primeiro conflito mundial mostrou que era preciso codificar a proteção de uma nova categoria de pessoas, os prisioneiros de guerra, a favor dos quais o CICV tinha empreendido já uma ação humanitária de envergadura, sem que aquilo fosse previsto pelos textos legais então vigentes. Pela experiência adquirida neste campo, se encarregou ao CICV a preparação de um projeto de código, que chegaria a ser transformado, em 1929, em "Convenção sobre proteção dos prisioneiros de guerra". 

O segundo conflito mundial evidenciou logo a necessidade de proteger a população civil como tal, já que pela primeira vez, as baixas dos "não combatentes" superavam as dos militares. 
Por outro lado, conflitos de caráter interno, como a sangrenta guerra civil espanhola retratada no quadro “Os mutilados” de Oswaldo Guayasamin, mostraram que os tratados humanitários tinham que se estender, de uma forma ou de outra, aos conflitos não internacionais. É assim que, uma vez finalizadas as hostilidades da segunda guerra mundial, nasceu um consenso generalizado tendente a adaptar e modernizar o direito humanitário. A Suíça, novamente, reuniu uma Conferência Diplomática, e o CICV teve a missão de elaborar os projetos dos acordos, os que toram aprovados em uma única sessão. 

São as quatro Convenções de Genebra de 1949, hoje em vigor e ratificadas pela quase totalidade da comunidade internacional, ou seja, 185 Estados; o Brasil é Parte nessas Convenções desde 1956. 
Importante ressaltar alguns princípios e funções, como "cláusula de Martens" de 1899, reproduzida nos Protocolos de Genebra de 1977 e na "Convenção das Nações Unidas sobre armas clássicas" de 1980. Ela predica que, "nas situações não previstas, tanto os combatentes como os civis, ficarão sob a proteção e autoridade dos princípios do direito internacional, tal como resulta do costume estabelecido, dos princípios humanitários, e das exigências da consciência pública". 

De acordo com o DIH, a aplicação constitui uma "espécie de válvula de segurança", destinada a acalmar apreensões políticas de quem temeria que certas normas do DIH, implicaria, no plano jurídico, em um reconhecimento de beligerância. 

Quanto aos chamados "princípios reitores do DIH", temos o princípio geral que recolhe o cerne do espírito dos seus tratados, enunciando que "as partes em conflito não infligirão aos seus adversários males desproporcionais ao objetivo da guerra", objetivo este que consiste em destruir ou debilitar o potencial militar inimigo. 

Isso significa, no campo do direito de Genebra, que as pessoas fora de combate, ou que não participam nas hostilidades, serão respeitadas, protegidas e tratadas humanamente. E no âmbito do "direito da Haia", significa que "o direito das partes de eleger os métodos e meios de guerra, não é ilimitado". 

Na área dos direitos das vítimas dos conflitos (vítimas no sentido dos tratados, ou seja, pessoas afetadas pelas hostilidades, e não na acepção moral, de pessoas injustamente prejudicadas), se destaca, em primeiro lugar, o "princípio de inviolabilidade". Esta inviolabilidade da vítima se exprime, entre outras, quanto à sua vida, sua integridade física e moral, suas convicções religiosas e pessoais, e seu bem-estar básico. 

A "não discriminação" representa igualmente um princípio essencial na aplicação dos preceitos do DIH, pois o tratamento dado ao adversário ferido ou prisioneiro, ou ao civil em país ocupado, não deve resultar de nenhuma discriminação fundada na raça, no sexo, na nacionalidade, ou nas opiniões políticas ou religiosas. 

No âmbito jurídico, todas as pessoas protegidas pelas Convenções devem se beneficiar do "princípio de segurança", no sentido, por exemplo, de que ninguém pode ser responsabilizado por uma ação que não cometeu, que ficam proibidos os castigos coletivos e as represálias, que qualquer pessoa se beneficia das garantias judiciais reconhecidas, e que ninguém pode renunciar aos direitos conferidos pelas Convenções. O conjunto dessas garantias representa, então, a permanência da legalidade jurídica, mesmo nos casos de conflitos armados, que são, justamente, a expressão cabal da ruptura da ordem vigente. 

Sempre no tocante às vítimas dos conflitos, está o princípio fundamental sobre o qual descansa a ação humanitária da Cruz Vermelha, a neutralidade da assistência aos feridos, assistência que nunca deve ser considerada como uma ingerência no conflito. Assim, coloca-se o pessoal sanitário "acima" dos combates; mas, em contrapartida dessa imunidade, ele tem a obrigação de se abster de qualquer ato de hostilidade, motivo pelo qual só pode portar armas de defesa pessoal. 

Mencionemos os diferentes tipos delimitações impostas no âmbito dos "meios e métodos de combate de acordo com as pessoas que obrigam a distinguir a população civil e os combatentes. 
Existem também limitações para com os lugares que protegem certos tipos de instalações como localidades não defendidas, edifícios históricos, culturais ou religiosos, ou instalações que contêm forças perigosas, entre outros. Que não podem conter ou ocultar objetivos militares, e, ao mesmo tempo, a população civil não pode ser utilizada para evitar que alvos não protegidos sejam atacados. 

E finalmente "limitações para com as condições", que abarcam as seguintes proibições: os ataques indiscriminados, as armas que causem danos excessivos com respeito às vantagens militares concretas e diretas previstas, as ações que possam afetar ao meio ambiente de forma extensiva, durável e grave, fazer padecer de fome e se utilizar de métodos de guerra baseando-se na traição, na perfídia, ou no abuso de emblemas reconhecidos, como a Cruz Vermelha, a bandeira de parlamentar, ou as insígnias de nacionalidade. 

Nas duas décadas que se seguiram à adoção das Convenções de Genebra, o mundo testemunhou um aumento na quantidade de conflitos armados não internacionais e de guerras de liberação nacional. Como consequência, os dois Protocolos Adicionais às quatro Convenções de Genebra de 1949 foram adotados em 1977. Eles fortalecem a proteção das vítimas dos conflitos armados internacionais (Protocolo I) e não internacionais (Protocolo II), colocando um limite na maneira em que as guerras são travadas. O Protocolo II foi o primeiro tratado internacional devotado exclusivamente às situações de conflitos armados não internacionais.   

Em 2005, um terceiro Protocolo Adicional foi adotado criando um emblema adicional, o Cristal Vermelho, que possui o mesmo estatuto internacional que os emblemas da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. 

Como demonstrado o paralelo entre as obras de Oswaldo Guayasamin e a necessidade de aplicação do Direito Internacional Humanitário, nota-se a importância da manifestação da arte para levar os fatos que talvez até então desconhecidos para a população mundial, fazendo com que reflitam sobre a real necessidade de normas que protejam nosso bem estar até mesmo em tempos de guerras, para que mesmo perante a batalha, haja limites que não possam ser ultrapassados e que caso ocorra, que haja punição equivalente.  




Fontes: 


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